(Foto: Conferência no Pentálogo III, "Internet: viagens no espaço e no tempo")

As sociedades científicas da semiótica e comunicação latino-americanas perderam, no dia 10 de dezembro, o querido amigo, colega, professor e pesquisador argentino Oscar Traversa.

Oscar Traversa acompanhou o CISECO desde a sua fundação e inicia esta trajetória através de sua presença no Pentálogo Inaugural “Transformações da Midiatização Presidencial: corpos, relatos, negociações, resistências”, em 2009, quando ministrou a conferência “Los dispositivos del Presidente”, representando a Universidade de Buenos Aires. Além do vínculo através das palestras, contribuiu na construção dos temas e impulsionou este projeto como cofundador. Criou laços intensos com a emoldurada Japaratinga ao fazer suas caminhadas matutinas pela praia acompanhando o nascer do sol e as rotinas dos pescadores da região, que ali buscam seu sustento diário, antes de entrar nas atividades do CISECO. Misturava-se a vida da pequena comunidade numa espécie de “etnografia livre”, coletando os signos que emergem da cidade, a fim de compreender melhor a semiosis daquele lugar.

Oscar Traversa esteve vinculado aos projetos científicos desta instituição numa ampla ambiência de intercâmbios, assim como em outras formas de atuação. Em 2018, embora não tenha participado presencialmente do Pentálogo, consolidou sua presença através da assinatura nos certificados emitidos aos participantes. No ano seguinte, meados de 2019, encaminhou mensagem ao CISECO, dizendo não poder estar conosco nas conferências do Pentálogo X em virtude de problemas de saúde. Em setembro 2020, convidado a participar do projeto de entrevistas, proposto como alternativa a realização do evento que deveria acontecer em Japaratinga, em razão da pandemia da Covid-19, mais uma vez responde mencionando dificuldades como consequência de sua enfermidade.

Além da contribuição intelectual, que se manifestou em quase todos os livros publicados pelo CISECO reunindo as conferências proferidas em cada Pentálogo, Oscar Traversa também compartilhou de momentos alegres. Confraternizou com seus colegas de diretoria do CISECO e todos aqueles com quem conviveu em nossos encontros durante as refeições, nas caminhadas pela praia e no divertido forró, que sempre brindou o encerramento daqueles eventos.

A ausência física de Oscar Traversa nos últimos eventos não significou um apagamento de suas ideias. Pelo contrário, seus conhecimentos sempre estiveram presentes através dos textos enunciados por seus pares, em diálogo com os artigos por ele publicados, bem como nos debates instigados pelos conteúdos discutidos em cada Pentálogo.

 

Em suas passagens pelo Brasil, outras instituições científicas  também puderam usufruir dos conhecimentos de Oscar Traversa, como o Work Shop realizado pelo  Programa de Pós-Graduação em Informação e Comunicação em Saúde (PPGICS)/Icict/Fiocruz, novembro de 2015, quando falou sobre a midiatização e a obesidade infantil, bem como no I Seminário Internacional de Pesquisas em Midiatização e Processos Sociais (Unisinos, dezembro de 2016) ao fazer parte da mesa de debates sobre “Meios, Dispositivos e Midiatização”.

Sua última obra individual, “Inflexiones del discurso: cambios y rupturas en las trayectorias del sentido” (Santiago Arcos editor, 2014) reúne diferentes trabalhos produzidos pelo autor ao longo de 25 anos com ênfase na correlação entre a técnica e o discurso chegando ao que denomina por dispositivo. Entre suas produções, prestou homenagens pela morte do amigo semioticista Eliseo Verón com artigo publicado na revista La Trama de la Comunicación (vol.23, nº2, 2019), “El origen y el cambio en la obra de Eliseo Verón”; e “Recetas para leer a Eliseo Verón”, disponibilizado pela DeSignis, número 29.

Oscar Traversa fez seus estudos acadêmicos de pós-graduação na Universidade de Buenos Aires e na École des hautes études en sciences sociales - EHESS, na qual teve como orientador Christian Metz. Como professor e pesquisador, dedicou-se aos estudos  nas áreas de semiótica, comunicação social, estética e discursividade social. Foi protagonista de vários projetos culturais, com destaque para a mais importante revista em semiótica, “Lenguajes”, entre  1974 e 1976, onde sua  breve  experiência foi lembrada em número especial publicado em 2014 com o tema “Foul-Tactico. Allá lejos y hacie tempos: las surpresas de la distancia”. Amigo e companheiro de Eliseo Verón, em vários projetos, entre eles o CISECO, cuidou até seus últimos dias dos “Arquivos Verón” ao lado de outros colegas, como Suzanne Cheveigené e Gaston Cigolani, cuja documentação está situada no Instituto Universidade das Artes- IUNA, em Buenos Aires.

Traversa, um grande mestre da escuta, apontou no texto escrito para La Trama de la Comunicación[1] que, ao nos interrogarmos sobre como levar adiante os problemas da investigação, talvez possa ser tomado como aconselhamento, ou pista de trabalho, a trajetória de Verón sobre a tarefa de empreender uma “teoria do ator”, interrompida pela morte do pesquisador em 2014. Assinala no mesmo artigo que, se Verón não nos deixou soluções, compartilhou a problemática; e, que a  sua “validação ou não leva tempo e, sobretudo, um esforço coletivo”.

Em sua sabedoria, Traversa deixa rastros da importância do dia seguinte e do “fazer em companhia” para o avanço do conhecimento.

Oscar Traversa, para sempre!

 

 

Conferências realizadas por Oscar Traversa nos Pentálogos do CISECO

Los dispositivos del Presidente”, no Pentálogo Inaugural, “Transformações da Midiatização Presidencial: corpos, relatos, negociações, resistências”, em 2009;

 

Economia e discursividade: o caso do consumo de carne na Argentina”, no Pentálogo II: “Economia e Discursividades Sociais: explorações da semiose econômica”, em 2010;

 

Web y alimentación: acerca de la publicidad destinada a los niños”, no Pentálogo III: “Internet: viagens no espaço e no tempo” - Colóquio Semiótica das Mídias, em 2012;

 

La fatalidad de la calle”, no Pentálgo IV: “A rua no século XXI: materialidade urbana e ‘virtualidade’ cibernética”, em 2013;

 

Durante sessão especial “Sobre Eliseo Verón (1935-2014)” (na abertura do evento) e com a palestra “Alimentación: la accidentada marcha de lo privado a lo público”, no Pentálgo V: “Dicotomia Público/Privado: estamos no caminho certo?”, em 2014;

Discursividades de las agencias de seguridad: vigilância directa y vigilância tecnológica”, no Pentálogo VI: “Vigiar a vigilância: uma questão de saberes”, em 2015;

 

Circulación del códice/circulación de lo impreso: en torno a os cambios de escala en Verón” (abertura do evento) e “Cambio históricos de la semiotización y circulación discursiva”, no Pentálogo VII: “A circulação discursiva: entre produção e reconhecimento”, em 2016;

 

En torno a la circulación cinematográfica”, no Pentálogo VIII: “Circulação discursiva e tranformação da sociedade”, em 2017;

 

[1] TRAVERSA, Oscar. El origen y el cambio en la obra de Eliseo Verón. In: La Trama de la Comunicación, vol.23, n2, 2019.

 

Última obra individual de Oscar Traversa

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“Acho que os dez anos do Pentálogo traduzem a força proativa da pesquisa universitária conduzida por mestres cientificamente inquietos, mas institucionalmente persistentes, como é o seu caso. O CISECO surfa vitorioso nas dificuldades. Vai continuar ainda que seja grande a onda adversa para a educação e a cultura no momento.”

Muniz Sodré - UFRJ